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Felipe Ehrenberg

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ENTREVISTA
Felipe Ehrenberg: inscrições culturais
Felipe Ehrenberg, 61, é adido cultural do México no Brasil - função que exerce há três anos; com isso, retoma uma velha tradição de seu país: a de fazer-se representar no exterior por artistas e / ou intelectuais. Ele se auto-define como artista visual: ´Voltei a pintar através do computador. Em vez de expor em um museu ou numa galeria, estará meu trabalho sendo exposto num filme de Beto Brant. Sou "clínica geral", e me sinto muito bem. Sou membro-fundador da primeira cooperativa de artistas plásticos que se forma em toda a América Latina: a Cooperativa de Artistas Visuais do Brasil - que já conta com quase quatrocentos membros. Estamos, inclusive, organizando um salão aberto, a coexistir com a Bienal de São Paulo. Já começamos a tecer dentro do tecido.´

A rigor, trata-se de um criador inquieto, sempre em busca de novos caminhos, daí a diversidade de sua produção, que se estende da pintura, do desenho às mais curiosas instalações. Vem, com certa freqüência, à Fortaleza - ocasião em que recebe as atenções do cônsul-honorário do México, o escritor João Soares Neto - através deste, foi possível esse encontro do Cultura com o espírito inventivo e desafiador de alguém que, há 45 anos, trabalha com o mundo das artes e da produção cultural.

Como imagina uma política cultural para a América Latina?

Uma política cultural para a América Latina deve ser, sobretudo, compartilhada. Os brasileiros, por exemplo, que vão ao México tão - somente visando entrar nos Estados Unidos da América do Norte, constituem um problema que exige das autoridades desses dois países uma reflexão acerca de suas conseqüentes ramificações. Com a liberação dos vistos, as fronteiras ficaram mais abertas. A televisão, ao que parece, dará um passo significativo, pois a Glória Perez está escrevendo uma novela, - cujo título, creio, há de ser ´América´ - na qual, dentre outros temas, abordará sobre brasileiros que se perdem no México, uma vez que a maioria
só conhece o nosso país através do ´Chaves´ - uma visão lúdica, portanto.

Mas vem aí a Alca...

Quanto aos assuntos comerciais, a Alca é inevitável. O Brasil e a Argentina, por exemplo, têm uma posição bem definida a esse respeito, pois, não obstante os naturais empecilhos, o Mercosul está crescendo. O México, por outro lado, considera a problemática da cultura como assunto de Estado. Por certo, nunca se ouviu falar nisso antes: a cultura como assunto de Estado, daí a atenção às manifestações culturais. E agora, como membro associado do Mercosul, tudo isso se ressalta. Assim, a cultura prepara um território para propiciar negócios com o Brasil.

E essas políticas culturais?

Por um lado, o Brasil avançou muito nas leis para apoio e incentivo à cultura. Passa a ter uma presença bem mais agressiva no exterior. Nesse sentido, o México tem muito a aprender com o Brasil, pois lá, há um apoio intenso do Estado, tant
o em relação à produção cultural quanto às manifestações gerais da cultura. Mas, com a entrada do neoliberalismo, - sem dúvida, agora, convertido em uma doutrina - os incentivos para a cultura são cada vez menores. Assim, a participação da sociedade, principalmente por meio da iniciativa privada, faz-se necessária. E, nesse campo, o Brasil tem apresentando avanços significativos, que, muito bem, podem nos apontar alguns caminhos.

E o que o Brasil pode aprender com o México?

Acho que o Brasil pode aprender com o México a ordem para a aplicação das leis. Em São Paulo já há um caminho a andar. O estímulo à distribuição do produto cultural é fundamental, pois satisfaz às necessidades do povo em geral. Nesse momento, nós estamos aqui, falando nessas cumplicidades, nessas parcerias. É importante, no entanto, que observemos que, desde 1970, a distância entre o Brasil e o México, curiosamente, foi aumentando. O México começou, antes, a virar o olhar mais para os Estados Unidos da América; agora, para o poder da União Européia. Por um tempo, esqueceu a extraordinária identidade que, nós, mexicanos, temos com a América Latina. Todos nós sabemos da forte repercussão que, por exemplo, os boleros tiveram aqui, no Brasil. O brasileiro sabe acerca da cultura asteca, da cultura maia; assim, o setor do turismo tem atraído muito os brasileiros. Devagar, o México se aproxima, cada vez mais, da América Latina.

Como vê a cultura brasileira?

Como observador, deparo a potência do Brasil, a força, a vitalidade de suas manifestações culturais. Antes de tudo, ressalto o seguinte: o Brasil tem uma voz própria. O desenho brasileiro, por exemplo, eu aço que tem uma voz poderosa, singularíssima. O brasileiro sempre vai encontrar um olho próprio, absolutamente seu. Sofre (como nós, os mexicanos, também) um grave problema da penetração americana, através das industrias culturais.O ministro da Cultura, Gilberto Gil, está preparando uma regulamentação da cultura, que tem despertado muita polêmica. Mas acho que será benéfica. Não só para a produção, por exemplo, do cinema, mas para sua exportação. O cinema emprega muita gente. Amplia a imagem contemporânea. São aspectos desafiadores: como evitar uma penetração total do produto americano, por exemplo, sem cair no nacionalismo barato, no populismo anacrônico.

A globalização...

É preciso controlar o nosso destino dentre da globalização. Brasil e México precisam, com rigor, definir políticas culturais, que, de modo bem amplo, envolvam a literatura, o cinema, o teatro, as artes plásticas etc, bem como a própria língua... Seis países - México, Guatemala, Equador, Bolívia, Paraguai e Brasil - têm uma forte presença de povos indígenas. Somos assim poliglotas, como os europeus; e se estes respeitam suas línguas, nos temos também que respeitar as nossas.

Qual a penetração da literatura brasileira no México?

É preciso pôr atenção nas traduções. México conhece Jorge Amado, Rubem Fonseca, mas não conhece os contemporâneos; o mesmo, por certo, se dá de modo inverso. É preciso, pois, um diálogo com o presente; os autores precisam conversar entre si, tem que haver uma troca de experiências. Daí a necessidade de incentivo aos jovens.

As artes contemporâneas no México...

México tem uma tradição nas artes da instalação. Às vezes, esquecemos que não foi inventada na Europa. Ora, antes da invasão européia, os mercados dos diversos povos indígenas já apresentavam uma ordem estética - eram, portanto, instalações. Mesmos os grandes altares, através dos quais os europeus tentavam impor aos povos nativos a fé cristã são instalações. Em verdade, as artes estão sempre em diálogo, por um canal, às vezes, desconhecido. A xilogravura feita no Brasil se parece muito com as artes populares à época da Revolução Mexicana. Portanto, não é preciso polarizar - cultura erudita e popular -, mas misturá-las. Quanto maior for a mistura, mais gente será por esta atingida.

Daí a grande contribuição dos povos indígenas...

México não demarcou terras indígenas, não criou reservas. Temos, em verdade, ainda países dentro do México. São muitas as línguas; e tão distintas quanto o Mandarim do Português. Não se preserva o que está vivo. Não há, em México, o perigo de extinção dos povos nativos. O que se protege é o direito dos povos indígenas de falarem suas línguas. Temos vários acadêmicos maravilhosos que traduziram essas línguas, nas quais reside uma fonte enorme de literatura. Agora, o importante é traduzir a literatura que agora esses povos produzem. A Espanha já abriu espaços para a diversidade de seus povos. Mas ainda não aprendemos de todo a respeitar tudo isso.
Carlos Augusto Viana
Editor
 

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